Artista - Harmonia; Brian Eno
Título - Tracks And Traces
Gravadora - Grönland Records
Ano - 2016 (1997)
Formato - reedição remasterizada / LP, vinil duplo
No final do verão de 1976, esse momento de revelação se abateu sobre os músicos do Harmonia como que por acaso. A banda havia feito dois álbuns até então, "Musik von Harmonia" (1974) e "Deluxe" (1975). Ambos os trabalhos são hoje considerados clássicos do krautrock e da música eletrônica; no entanto, depois disso, o núcleo criativo seguiu caminhos diferentes. Os três músicos eram incansáveis e começaram a trabalhar em projetos solo. Michael Rother lançaria mais tarde "Flammende Herzen", Hans-Joachim Roedelius "Durch die Wüste" e Dieter Moebius "Lilienthal". Mas então Brian Eno entrou em cena. Ele conhecia o Harmonia há muito tempo e até mesmo participou espontaneamente de uma sessão com a banda em um show no Fabrik, em Hamburgo, em 1974. Os músicos não se acanharam em expressar seu interesse em uma nova colaboração e trocaram números.
Dois anos depois, Eno ligou para os membros do Harmonia e perguntou: "Agora é uma boa hora?" A resposta foi: "Bem, não exatamente - nós meio que nos separamos - mas, com certeza, é um momento tão bom quanto qualquer outro".
Naquela época, Eno estava a caminho de Montreux para trabalhar com David Bowie no álbum "Low". Um homem muito viajado no beau monde do rock, ele entrou no estúdio no vilarejo rural de Forst, na região de Weserbergland, na Alemanha, sem nenhuma pretensão. Para citar Rother, "Eno não parecia um astro pop distante; pelo contrário, ele era muito agradável e curioso. Trabalhávamos como parceiros iguais e éramos um coletivo que simplesmente queria fazer música, sem pensar em sucesso comercial e sem a pressão de ter que gravar um álbum. Para mim, essas são as melhores condições de trabalho que se pode ter." "Eno trouxe um grande intelecto, um prazer ilimitado em fazer música e uma fonte de experiência no campo da música popular, e isso claramente abriu uma porta que já estava fechada", acrescenta Roedelius. Apesar disso, o público em geral não ouviu nada dessas gravações por muito tempo, em parte porque elas não foram feitas para fins comerciais, mas também porque as fitas originais de Eno foram consideradas perdidas por muito tempo. Felizmente, Roedelius e Rother haviam feito cópias das fitas de quatro faixas.
Do nada, em 1997, a Harmonia lançou o álbum "Tracks & Traces", que incluía clipes das lendárias sessões de gravação de 1976. Roedelius examinou o material em sua posse e o remixou usando um processo técnico elaborado. "Não fiz nada mais do que remasterizar tecnicamente o material original (uma das três fitas de quatro faixas que havíamos gravado) com engenheiros de som austríacos e aprimorá-lo para que pudesse ser digerido por outros ouvintes além de nós mesmos", lembra Roedelius. Rother explica com mais precisão: "Devido à discórdia dentro da banda, Achim montou a música por conta própria. As novas faixas gravadas em 1997 são, portanto, uma expressão de sua personalidade em sua ênfase atmosférica. Möbi e eu não estávamos satisfeitos com o fato de Achim ter feito tudo sozinho, mas tivemos que admitir que ele havia feito um excelente trabalho. Mesmo assim, chegamos a um consenso sobre o título e a arte, então Möbi e eu estávamos, de certa forma, envolvidos (risos). Mas realmente não se pode dizer nada de ruim sobre a música, ela é maravilhosa". Não podemos fazer nada além de concordar com essa avaliação. Em "Vamos Compañeros", um groove descarado aparece na forma de um som de motor a vapor em loop. O desvio idílico proporcionado em "By the Riverside" dá lugar abruptamente a uma fase experimental abstrata com um tom sombrio. Um dedo de advertência é levantado, avisando: "Não se perca em Lüneburg Heath". Depois de "Weird Dream", o clima volta a se animar e o ouvinte é brindado com harmonias mais quentes e pop e com a guitarra slide, conhecida dos últimos trabalhos de Eno, embora, nesse caso, seja Rother quem a toque. Mas, é claro, a história não termina aí.
O próprio Rother também tinha uma cópia guardada em seu estúdio desde 1976. Um dia, ele decidiu digitalizar os 27 fragmentos contidos nela. Embora o material pudesse ter preenchido um álbum inteiro, eles concordaram em adicionar três das músicas à reedição do álbum de 1997. "Inicialmente, perguntei a mim mesmo o que fazia sentido musicalmente; quais das muitas faixas eu gostava particularmente e quais refletiam melhor o amplo escopo musical de nossa colaboração com Brian Eno. A etapa seguinte foi sobre a melhor forma de integrar as faixas selecionadas ao álbum existente. Em vez da prática normal de colocá-las no final do álbum como faixas bônus, propus mudar a estrutura do álbum e a ordem das faixas. Felizmente, todos os envolvidos concordaram com isso". O álbum agora se desenvolve gradualmente com a introdução "Welcome" e a segunda faixa "Atmosphere", antes de prosseguir para "Vamos Compañeros", a partir da qual ganha o ímpeto confiável do lançamento original. O álbum é finalizado com "Aubade", uma faixa que reforça a impressão de uma conclusão reconciliadora.
Como se costuma dizer, as coisas boas levam tempo. E agora, 33 anos depois que essas gravações foram feitas, finalmente temos uma versão satisfatória de um tesouro perdido da era do krautrock. É muito provável que esse projeto sinalize o fim da era Harmonia. Embora a banda tenha se reunido há dois anos e realizado alguns concertos altamente aclamados em Berlim, na Grã-Bretanha, nos EUA e na Austrália, após o lançamento da célebre gravação do concerto Live 1974, Rother e Roedelius declararam conjuntamente que não haveria continuação das apresentações ao vivo - mesmo que isso fosse lucrativo para eles de várias maneiras. Mas a vanguarda alemã da década de 1970 nunca se deixou escravizar por interesses comerciais. Seu credo continua o mesmo da época: A boa música é aquela que nasce da alma não adulterada do artista, não algo fabricado com estratégias e jogos intelectuais, independentemente de sua natureza. E, como se pode ver em Harmonia & Eno 1976 - Tracks and Traces, a qualidade não perde seu brilho nessas condições - nem mesmo com o passar das décadas. Portanto, por favor, busque os rastros!
